MANIFESTO DA SOCIEDADE CIVIL DO DF CONTRA O PL 445/2015 – QUE “ALTERA A LEI DO SILÊNCIO”
- CCAS
- 30 de jun. de 2015
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A Pró-Federação em Defesa do Distrito Federal agrega mais de quarenta entidades da sociedade civil do Distrito Federal e, neste Manifesto, está representada: pelos Conselhos Comunitários da Asa Sul – CCAS e da Asa Norte – CCAN (que, por sua vez, representam mais de duzentos mil habitantes de Brasília e moradores da Asa Sul e Norte), pelo Conselho Comunitário do Sudoeste, o Fórum das ONGs Ambientalistas do Distrito Federal, o Instituto Pactos de Desenvolvimento Regional Sustentável, a Prefeitura do Setor de Diversões Sul, a Associação dos Moradores do Lago Sul, a Associação Comunitária do Park Way, a ASCOM – Associação dos Comerciantes da Asa Sul, o Centro de Estudos para o Desenvolvimento da Cidade, a Prefeitura Comunitária da Península Norte, contando, ainda, com a participação e apoio do Instituo Histórico e Geográfico do Distrito Federal – IHG-DF. Essas entidades, que há mais de vinte anos acompanham os planos e projetos de intervenção urbana no DF, contribuindo com pareceres técnicos e sugestões, vêm MANIFESTAR-SE CONTRARIAMENTE AO PROJETO DE LEI Nº 445/2015 em tramitação na Câmara Legislativa do Distrito Federal, que “dispõe sobre sons e ruídos, fixa níveis e horários em que será permitida sua emissão”, pelas seguintes razões:
1 – Não apresenta fundamentação técnica que justifique o aumento dos atuais limites máximos de pressão sonora no DF para 70dB noturnos e 75dB diurnos, tanto em áreas urbanas como rurais. Aos atuais 50dB noturnos e 55dB diurnos permitidos em áreas urbanas (área mista, predominantemente residencial) se somariam mais 20 decibéis. Em áreas rurais, os limites atuais de 35dB noturnos e 40dB diurnos quase que dobrariam. Na prática, por se tratar de uma escala logarítmica, isto corresponde a multiplicar os atuais níveis por 100.
2 – Desconsidera as Normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT NBR 10.151 e 10.152, base para qualquer lei disciplinadora de poluição sonora no país, as Resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) nº 01/1990 e nº 02/1990 e as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS), agência subordinada à Organização das Nações Unidas (ONU). Assim, o PL descumpre normas nacionais e internacionais em nome de interesses comerciais, sob a alegação de proteção à cultura e ao emprego.
3 – Retrocede ao desconsiderar os efeitos dos novos níveis máximos de sons e ruídos propostos e não apresentar estudos que permitam averiguar os reflexos destes sobre a saúde e a integridade física humana. A vasta literatura disponível aponta na direção de evidenciar os efeitos nocivos dos excessos de ruído à saúde, tanto psicológica, quanto fisiológica. Zanin (1990) relata que o ruído age sobre o 2 organismo humano de várias maneiras, prejudicando não só o funcionamento do aparelho auditivo como comprometendo a atividade física, fisiológica e mental do indivíduo a ele exposto. Fiorini e Cols (1991), afirmam que o ruído pode perturbar o trabalho, o descanso, o sono, e a comunicação dos seres humanos; pode prejudicar a audição e causar ou provocar reações psicológicas e fisiológicas. O direito à saúde deve sobrepor-se ao direito à cultura e diversão, pois um é pré-requisito para o outro. Nenhuma legislação pode atuar no sentido de limitar o direito das pessoas à saúde.
4 – Não faz distinção entre as zonas receptoras (áreas residenciais, comerciais, hospitalares e educacionais). Ao definir os novos limites máximos de pressão sonora no DF para 70dB noturnos e 75dB diurnos, não considera, por exemplo, a legislação trabalhista brasileira (Norma Regulamentadora nº 17), que regulamenta os níveis considerados de conforto acústico para o exercício de atividades de atenção (como em sala de aula) até 65dB. "Por se tratar de um risco para a qualidade de vida dos professores e da população em geral, sugerem-se, aos responsáveis pela saúde pública e educação, medidas de reconhecimento e controle na prevenção dos aspectos extra-auditivos do ruído, amenizando seus efeitos nocivos." (Cláudia G. de O. Gonçalves - doutora em saúde coletiva pela Unicamp)
5 – É inconstitucional, pois a Constituição Federal determina que a saúde é um direito social de todos e um dever do estado (Art. 6º e Art. 196). O direito à saúde é consequência indissociável do direito à vida, tornando-se assim um direito inviolável. O PL proporciona a criação de direitos distintos para pessoas submetidas às mesmas situações, o que fere também o princípio constitucional da isonomia, previsto no art. 5º da Constituição Federal.
6 – Retrocede em relação ao meio-ambiente. Segundo a OMS, a poluição sonora é qualificada como crime ambiental, com base no artigo 54 da Lei 9.605/98 - Lei dos Crimes Ambientais, sendo uma das três prioridades para a década.
7 – Apresenta total subjetividade e falta de embasamento para a formulação dos parâmetros de aferição do som, definidos na NBR 10.151 e adotados pela lei em vigor, acarretando entraves à fiscalização. Como condição para a validação do processo de fiscalização, cria a figura do reclamante, único legitimado para provocar o poder de polícia dos órgãos da administração. Além disso, elimina o direito de sigilo do denunciante, obrigando-o a se sujeitar que a aferição dos níveis de ruído se dê dentro de sua residência, com portas e janelas fechadas. É incompatível subordinar a fiscalização dos órgãos públicos ao eventual consentimento de particulares no processo de aferição das ilegalidades.
8 - Elimina limites à poluição sonora no período do carnaval. Nem mesmo cidades consagradas como polos turísticos carnavalescos, como Rio de Janeiro, Salvador e Recife, que têm sua economia impulsionada em razão desse período, ousaram excepcionar suas leis além desses limites.
9 - Torna Brasília, nossa capital federal, a cidade do país mais permissiva em termos de sons e ruídos. Os limites propostos de 70dB e 75dB para os períodos noturno e diurno são considerados elevados, equiparando-se aos limites de ruído observados em vias de grande circulação, como o Eixo Monumental, em horário de pico (www.ibram.df.gov.br/content/article/310.html).
10 – Desrespeita a legislação de proteção do Conjunto Urbanístico de Brasília, Patrimônio Cultural nas instâncias Distrital, Federal e da Humanidade. Brasília é uma cidade planejada, diferente e única, protegida pelo tombamento e por sua condição de Patrimônio Mundial. O plano de Brasília não é apenas um desenho, é uma concepção de cidade. De acordo com o Decreto Distrital nº 10.829/87, a Portaria nº 314/92 do IPHAN e documentos anexos, os comércios locais fazem parte da Escala Residencial, que deve proporcionar uma nova maneira de viver, própria de Brasília. Assim, quem “dita regras” nos setores dessa escala é o uso residencial, sendo que os demais usos devem atender ao uso residencial predominante. Os conceitos de Superquadra e de Unidade de Vizinhança incluem, dentre outros fatores, a serenidade urbana decorrente do novo modo de morar. Desse modo, estabelecimentos comerciais de grande porte ou com níveis altos de ruído ali instalados acarretam inúmeros transtornos para os moradores e conflitam com a legislação de proteção.
A título de contribuição, sugerimos que o GDF promova ações para resgatar a função da Escala Gregária, conforme prevista no plano urbanístico de Lucio Costa, estimulando o uso comercial e de prestação de serviços nos setores de Diversões, Comerciais, Bancários e Hoteleiros.
Por todos os motivos expostos, as entidades da sociedade civil, abaixo elencadas, registram que o PROJETO DE LEI Nº 445/2015 NÃO ATENDE AO INTERESSE PÚBLICO, pressuposto indispensável para aprovação de qualquer proposição desse porte, de tamanhas repercussões e danos à saúde da população e ao meio ambiente, e reiteram o POSICIONAMENTO CONTRÁRIO À SUA APROVAÇÃO.
Brasília, 18 de junho de 2015
Conselho Comunitário da Asa Sul - José Daldegan Júnior
Presidente Conselho Comunitário do Sudoeste - Elber Rocha Barbosa
Presidente Instituto Pactos de Desenvolvimento Regional Sustentável - Tânia Battella de Siqueira
Prefeitura do Setor de Diversões Sul - Flávia Portela
Prefeita Associação dos Moradores do Lago Sul - Edlamar Batista
Presidente Associação Comunitária do Park Way - Gilma Rodrigues Ferreira
Presidente Conselho Comunitário da Asa Norte - Maria das Graças Borges Moreira
Presidente Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federa - l Vera Ramos
1 a Vice Presidente Fórum das ONGs Ambientalistas do Distrito Federal - Mara Moscoso
Centro de Estudos para o Desenvolvimento da Cidade - Silvana Tayar Diretora
Prefeitura Comunitária da Península Norte - Fernando Varanda Prefeito
ASCOM – Associação dos Comerciantes da Asa Sul - Artur Benevides
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